Brasília,
30 de julho de 2012.
À Comissão Nacional da Verdade
Nós, Comitês, Fóruns e
Coletivos abaixo signatários, reunidos em Brasília, entidades organizadas em
diversos estados da Federação e comprometidas com o direito à Memória, à
Verdade e à Justiça, participamos do “Encontro da Comissão Nacional da Verdade
com Comitês Estaduais da Sociedade Civil”.
Reunidos por ocasião deste
Encontro, expusemos perante a Comissão Nacional da Verdade as sugestões de
trabalho, organizadas e reunidas no presente documento.
I.
DAS ENTIDADES
Firmam o presente
documento/manifesto:
·
Associação
dos Amigos do Memorial da Anistia Política do Brasil
·
ATAMIG
– Associação dos Trabalhadores Anistiados, Autônomos, Liberais, Aposentados e
Pensionistas de Minas Gerais
·
Centro
de Direitos Humanos e Memória Popular de Foz do Iguaçu
·
Coletivo
RJ Memória, Verdade e Justiça
·
Comissão
da Verdade e do Memorial da Anistia OAB/MG
·
Comitê
Baiano pela Verdade, Memória e Justiça
·
Comitê
Estadual Pela Memória, Verdade e Justiça de Mato Grosso Sul
·
Comitê
Estadual pela Memória, Verdade e Justiça do Rio Grande do Norte
·
Comitê
Goiano da Verdade, Memória e Justiça
·
Comitê
Maranhense da Verdade
·
Comitê
Memória, Verdade e Justiça de Parnaíba/PI
·
Comitê
Memória, Verdade e Justiça de Pernambuco
·
Comitê
Paraense em Defesa da Comissão da Verdade
·
Comitê Paulista pela Memória, Verdade e Justiça
·
Comitê pela Verdade Memória e Justiça do Distrito
Federal
·
Comitê pela Verdade, Memória e Justiça de Campinas
·
Comitê
pela Verdade, Memória e Justiça de Pelotas e Região
·
Comitê
pela Verdade, Memória e Justiça do Piauí
·
Comitê pelo Direito à Memória, à Verdade e à Justiça do Ceará
·
Comitê
Santamariense de Direito à Memória e à Verdade – Santa Maria/RS
·
Grupo
Tortura Nunca Mais – PE – Núcleo de Memória
·
Grupo
Tortura Nunca Mais – SP
·
Núcleo
de Preservação da Memória Política
II.
DAS SUGESTÕES
1.
Concentrar suas atividades na apuração e
esclarecimento dos graves atentados aos Direitos Humanos praticados por agentes
do Estado no período de 1964-1985, que corresponde ao período da Ditadura Civil-Militar,
no sentido estrito.
1.1.
Esclarecer também os casos de graves atentados
aos direitos humanos ocorridos no período pré-golpe militar de 1964 (1961-1964),
a exemplo do assassinato e desaparecimento, em 1962, de Pedro Fazendeiro e Nego
Fuba, das Ligas Camponesas de Sapé (PB), considerados os dois primeiros
desaparecidos políticos, e no período do governo de transição civil (1985-1988), como determina a Lei 9.140/1995;
1.2.
Debruçar-se sobre o Golpe Civil-Militar
em si, suas circunstâncias e precedentes, buscando evidenciar a colaboração do
setor civil da sociedade brasileira na violação sistemática de Direitos
Humanos, ocorrida no período;
1.3. Considerar
os casos de graves violações dos direitos humanos praticados por agentes
privados em conluio com agentes do Estado, caracterizados como repressão
politica e social.
1.4. Desenvolver
linha de pesquisa específica sobre a legislação do regime ditatorial,
observando quais normas continuam vigentes, a despeito de sua inadequação com
os princípios democráticos, para que, com o relatório final, sejam submetidas
ao Congresso Nacional para revogação (Ex: legislação que implantou eleições
indiretas nas Universidades para escolha de reitor);
1.5. Investigar
as relações internacionais de repressão, especialmente com Bolívia, Paraguai,
Argentina e Uruguai, associadas a mortes e perseguições no exterior (Exemplo,
caso Frei Tito, Maria Auxiliadora Lara Barcelos, etc.);
2.
Priorizar os casos dos mortos e
desaparecidos políticos decorrentes da repressão policial-militar do período 1964-1985.
2.1. Sobre
cada caso produzir relatório específico nos termos do art. 3º, incisos I, II,
III e IV da Lei nº 12.528 de 2011.
2.2. Fazer
um trabalho prévio sobre cada um dos casos de mortos e desaparecidos políticos,
sistematizando:
a) Informações reunidas pela Comissão Especial
sobre Mortos e Desaparecidos Políticos e pela Comissão de Anistia;
b)
Testemunhos, documentos, publicações
produzidos individualmente e coletivamente por Familiares de Mortos e
Desaparecidos Políticos;
c) Em relação aos casos dos mortos políticos,
mandar fazer análises técnicas dos laudos de necropsia, das fotos dos
cadáveres, elaborando-se laudos periciais comparativos;
d)
Os
documentos oficiais já conhecidos;
e) Os depoimentos já registrados;
f) Os nomes de agentes do Estado envolvidos;
g)
As instituições
do Estado envolvidas;
h)
As
pessoas e instituições privadas envolvidas;
i) Os
locais de prisão, tortura e/ou desaparecimento (neste ponto, destaca-se a
necessidade de se realizar um mapeamento dos variados locais utilizados para
prisões, como navios, estádios, casa particulares, etc.);
j) Testemunhos
já prestados por então presos políticos perante Tribunais Militares, bem como
documentos individuais e coletivos de Denúncias de Torturas e Assassinatos;
k)
Depoimentos, testemunhos e documentos já
acumulados por Universidades Públicas e Privadas; por Sindicatos, Centrais
Sindicais, Movimentos Populares e outras entidades representativas como a Ordem
dos Advogados do Brasil;
l) Depoimentos,
documentos e testemunhos acumulados por entidades como Comitês/Fóruns/Coletivos;
Grupos Tortura Nunca Mais; Centros de Direitos Humanos e Associações de
Anistiados;
m)
Documentos dos Arquivos privados (neste ponto,
destaca-se a necessidade de requisitar documentos em poder de torturadores
denunciados e/ou de seus familiares, em caso de falecimento. Exemplo: Capitão
Fleury);
n)
Documentos dos Arquivos Públicos (neste ponto,
destaca-se a necessidade de exigir a abertura dos documentos das Forças
Armadas);
o)
Realizar
cruzamentos de informações obtidas com documentos da repressão, depoimentos,
livros, objetivando um resultado idôneo e incontestável;
2.3. Convocar agentes do Estado envolvidos direta e
indiretamente nos casos de sequestros, mortes sob tortura, execuções
extrajudiciais, desaparecimentos forçados, ocultação de cadáver, obstrução da
Justiça, inclusive agentes do Estado do aparelho Judicial Militar; e agentes
privados a serviço do Estado citados;
2.4. Promover busca ativa dos restos mortais dos
desaparecidos políticos e relatar o estado atual das buscas;
2.5. Promover busca ativa de documentos nos arquivos das
Forças Armadas, especialmente os Arquivos do DOI-CODI, da Operação Condor e das
campanhas das Forças Armadas contra a Guerrilha do Araguaia; dar acesso a tais
arquivos aos sobreviventes e familiares de mortos e desaparecidos durante a
ditadura;
2.6. Ouvir todos os familiares de mortos e desaparecidos
políticos que queiram prestar depoimento à CNV;
2.7. Promover audiências públicas sobre os casos de mortos e
desaparecidos políticos, de forma individual ou coletiva, quando historicamente
adequado;
2.8. Fixação de lista formal dos responsáveis
por cada um dos crimes na condição de mandantes, executores, facilitadores,
omissos, mandantes, cúmplices e acobertadores, em todos os níveis da cadeia de
mando e/ou hierárquica, seja militar, policial, civil, autárquica, cartorial,
médico-legal, prisional, legislativa ou resultado da articulação entre elas. (O
mesmo serve para o item 3 – crimes de tortura);
2.9
Responsabilizar as organizações
especiais de repressão da ditadura (OBAN, DOI-CODIs, CIEX. CENIMAR, etc.) e os
grupos a ela ligados por crimes contra a Humanidade;
2.10
Afastar dos trabalhos da
Comissão Nacional da Verdade, qualquer resquício da “teoria dos dois demônios”.
As investigações da Comissão deverão objetivar a ação de agentes do Estado,
rede de colaboração e apoio, envolvidos na prática sistemática de violação de
Direitos Humanos. Os crimes que a CNV deve investigar são os crimes de Estado,
refutando-se assim qualquer possibilidade de investigar ações da resistência à
Ditadura Civil-Militar;
2.11
Tendo em vista o
volume de trabalho e, em decorrência, o grau de dedicação que se espera dos
Comissionados, é importante que desde o início a necessidade de atuar com
dedicação exclusiva se faça presente, não apenas para os funcionários públicos,
mas a todos os membros da Comissão. Acreditamos que a participação dos membros,
deva ser em tempo integral, com prejuízo das suas funções normais,
especialmente quando se trata de agente público com mais de um vínculo, ou
profissional oriundo da iniciativa privada. Tudo isso, será capaz de amenizar o
reduzido número de recursos humanos que compõem a Comissão;
3.
Sobre os casos de torturas infligidas aos
opositores políticos
3.1. Reunir
todas as denúncias de tortura já disponíveis, produzidas na época dos fatos ou
posteriormente, como:
a) Depoimentos em tribunais militares;
b)
Documentos individuais e coletivos de denúncia
de tortura enviados a autoridades nacionais e internacionais (Centro de Defesa
de Direitos Humanos; Ordem dos Advogados do Brasil; Anistia Internacional;
Comitê Internacional das Igrejas; e outros);
c) Depoimentos a centros de Memória de
Universidades e outras entidades públicas e privadas de pesquisa;
d)
Casos que
foram objeto de Inquéritos Policiais Militares; Inquéritos Policiais (Civis);
Comissões Parlamentares de Inquérito; etc.
e) Publicações existentes: livros, artigos,
dissertações, teses, etc.
3.2. Ouvir os sobreviventes, opositores políticos,
que foram aprisionados sem mandado judicial ou com mandado judicial e que
sofreram torturas por agentes do Estado e ou agentes privados em conluio com
agentes do Estado;
3.3. Ouvir as pessoas que foram presas e foram
submetidas a torturas;
3.4. Convocar para depor agentes do Estado citados
como torturadores, integrantes das
equipes de análise dos setores de inteligência do Exército, Marinha e
Aeronáutica e/ou comandantes de centros de tortura, como OBAN; DOI-CODI;
Centros de Tortura de Polícias Civis e Militares; Centros clandestinos de
Tortura e Casas da Morte; Forças Armadas; Bombeiros; P2 (Inteligência); e
Polícia Federal.
3.5. Convocar para depor agentes do Estado do
aparelho Judicial Militar e compelir a Polícia Federal – bem como as Forças
Armadas - para abertura de seus arquivos.
3.6. Sistematizar o conjunto dos casos e sempre que
possível descrever casos individuais ou coletivos com maior suporte testemunhal
ou documental.
3.7. Aprofundar
pesquisas sobre a repressão em outras regiões do Brasil, fora dos grandes
centros e poucos conhecidas;
3.8. Desenvolver
uma linha de investigação e esclarecimento para as graves violações de direitos
humanos cometidas contra jornalistas e trabalhadores da educação, entre outros;
4.
Constituir na Comissão Nacional da Verdade
um mecanismo ágil para receber todas as formas de denúncias e documentação
sobre graves violações de direitos humanos apresentados por cidadãos e
instituições privadas, inclusive depoimentos, como manda o inciso I do Art. 4º;
e o parágrafo 6º do Art. 4º da Lei 12.5128/2011.
4.1. Processar
os documentos, depoimentos e documentos aportados, segundo as linhas temáticas
de trabalho da CNV;
4.2. Delegar
a entidades credenciadas pela CNV o recebimento de tais documentos e denúncias;
4.3.
Estruturar mecanismo de ação
IMEDIATA diante do recebimento de denúncias que venham a ser apresentadas, com
intuito de evitar desaparecimento das informações e assegurar a proteção dos
arquivos, sempre dentro da lógica: OUVIR – RELATAR – AGIR;
4.4.
Possuir grupo/subcomissão específica
para trabalhar com arquivo, com pessoal técnico especializado na área.
5.
Esclarecer as graves violações de direitos
humanos cometidas contra camponeses, trabalhadores rurais, povos indígenas,
garimpeiros, comunidades tradicionais, por agentes do Estado e por agentes
privados a serviço, ou apoiados por agentes do Estado, bem como apreciar outras sugestões de linhas de pesquisa específicas.
5.1. Desenvolver uma linha de investigação e
esclarecimento para as graves violações de direitos humanos cometidas contra os
camponeses e trabalhadores rurais, senso lato, incluindo os crimes praticados
por polícias privadas paraestatais e agentes privados em conluio com poderes do
Estado;
a) Promover parcerias com entidades
representativas do campesinato, tanto sindicais, como a CONTAG, FETRAF, CUT,
CTB e outras centrais sindicais; com movimentos populares como o MST, o MLST e
outros;
b)
Consultar
entidades e especialistas sobre Lutas Camponesas, Memória Camponesa e Pesquisa
sobre Repressão aos movimentos camponeses, como a Comissão Pastoral da Terra
(CPT), a rede acadêmica de pesquisa sobre a Memória Camponesa e outros;
c) Coletar depoimentos de sobreviventes dos
massacres, chacinas e atos repressivos aos camponeses;
d)
Consultar
os documentos de casos que foram objeto de Inquéritos Policiais e Processos
Judiciais;
e)
Investigar e analisar a relação
entre o aparato repressor da época da ditadura e a atividade policial e de
milícias de latifundiários atualmente existentes;
f) Produzir um relatório específico sobre os
graves atentados aos direitos humanos contra camponeses.
5.2. Desenvolver
uma linha de pesquisa especifica e esclarecimento sobre graves violações de
direitos humanos dos povos indígenas e comunidades tradicionais, incluindo
assassinatos de lideranças, de comunidades, deslocamentos forçados e grilagem
de suas terras, com consequências para sua sobrevivência física e cultural:
a)
Levantar todos os dados existentes sobre graves
violações de direitos humanos dos povos indígenas em publicações, denúncias, e
relatórios oficiais;
b)
Ouvir entidades e pesquisadores da causa
indígena, como o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), a Comissão Pastoral
da Terra (CPT), a Operação Amazônia Nativa (OPAN); e outros;
c)
Ouvir representações de entidades e lideranças
indígenas e comunidades tradicionais, como
quilombolas e outros;
d)
Produzir um relatório específico sobre as graves
violações aos direitos humanos dos povos indígenas e comunidades
tradicionais;
e)
Massacres e casos que devem ser
investigados: Massacre de Ipatinga (1963, em MG), Massacre dos Suruís nos anos 1970,
Massacre do Paralelo 11 (1963), desaparecimento de mais de 2.000 índios
Waimiri-Atroari em 1972, investigar a existência de campos de concentração de
indígenas em fazenda do Exército em Minas Gerais (Fazenda Guarani), extermínio
de duas tribos Pataxós na Bahia, entre outros.
f)
Investigar os métodos de extermínio
utilizados contra populações indígenas, a exemplo da disseminação de varíola em
comunidades;
5.3.
Desenvolver uma linha de pesquisa
específica para esclarecimento das perseguições e repressão aos trabalhadores,
com a identificação de trabalhadores perseguidos, assassinados, desaparecidos
e/ou vítima de tortura e que não constam nas listas oficias já existentes;
5.4.
Desenvolver uma linha específica
para investigar a colaboração entre diversos países na organização da
repressão. Neste aspecto, merecem atenção as regiões fronteiriças e casos ali
ocorridos, a exemplo do “Navio Prisão”, em Corumbá-MS, fronteira com a Bolívia.
No mesmo sentido, especificamente à Operação Condor, requer seja apurada a
colaboração da Bolívia na perseguição de acreanos, participação até hoje
ignorada e não investigada a fundo, além da participação dos países comumente
apontados como integrantes dessa Operação;
5.5.
Desenvolver linha de pesquisa
específica sobre a legislação do regime ditatorial, observando quais normas
continuam vigentes, a despeito de sua inadequação com os princípios democráticos.
Propor a sua revogação;
5.6.
Investigar detidamente as estruturas
do aparato repressor, observando suas especificidades em cada região, e
identificar locais onde estas estruturas ainda existem parcial ou
integralmente. Merece destaque, nesse sentido, a estrutura da ABIN no Estado do
Pará, que ainda conta com agentes que trabalharam na repressão (a exemplo de
Magno José Borges e Armando Souza Dias), ou ainda o caso de integrantes da
repressão e que continuam na ativa (é o caso do chefe de Operações da ABIN no
Distrito Federal e que foi um dos agentes que trabalhou na Operação Sucuri no
Araguaia). Recomendar em seu relatório final o afastamento desses agentes como
medida de garantia de não-repetição das graves violações de direitos humanos
perpetradas;
5.7.
Investigar a repressão aos militares
que se insurgiram contra o Golpe e o regime ditatorial, bem como sobre os
chamados “militares melancias” – termo usado para caracterizar aos que eram
verde por fora, farda militar, porém, vermelhos, ideologicamente por dentro;
6.
Estabelecer uma linha de pesquisa e
esclarecimento das violações de direitos civis
6.1. Averiguar, esclarecer e relatar os casos de
deposição de governos eleitos, fechamento do Congresso Nacional e outras casas
legislativas e cassação de mandatos eletivos;
6.2. Averiguar, esclarecer e relatar os casos de
intervenção policial, militar e administrativa, fechamento, destruição de
sedes, perseguição aos filiados, de entidades representativas dos
trabalhadores, como Sindicatos, Ligas Camponesas e outras organizações
culturais dos trabalhadores (violações à liberdade de
associação, por exemplo);
6.3. Averiguar,
esclarecer e relatar os casos de intervenção policial, militar e administrativa
em Universidades e instituições de pesquisa públicas e privadas por motivações
políticas e ideológicas por parte da ditadura militar; bem como a cassação de
autoridades universitárias, demissão de professores e controle policial da vida
acadêmica;
6.4. Averiguar, esclarecer e relatar a atuação
paramilitar do CCC, MAC e os casos de repressão à resistência dos movimentos
estudantis, como: intervenção policial, militar e administrativa em entidades
representativas dos estudantes, como Grêmios Estudantes Secundaristas – tais
como UESES (União dos Estudantes Secundaristas do ES), AMES (Associação
Metropolitana dos Estudantes Secundários do RJ) (ES) – e a União Brasileira dos
Estudantes Secundaristas (UBES); Diretórios e Centros Acadêmicos
universitários, Uniões Municipais e Estaduais de Estudantes Universitários e
União Nacional dos Estudantes (UNE);
6.5. Averiguar e esclarecer os casos de intervenção
policial e militar, as atividades de censura e perseguição aos meios de
comunicação, bem como perseguição aos profissionais da imprensa – tais como jornal
“Folha Capixaba”, no Espírito Santo, e o jornal “Novos Rumos”, no Rio de
Janeiro.
7.
Investigar, esclarecer e dar publicidade no
Relatório Final sobre o envolvimento de alguns setores empresariais com o
financiamento e apoio ao aparato de repressão policial-militar, oficial e
clandestino; em alguns casos, especialmente no campo, identificar pessoas e
empresas que organizaram e mantiveram polícias privadas envolvidas em repressão
às lideranças camponesas e povos indígenas.
8.
Assegurar assistência psicológica e médica
aos ex-perseguidos e ex-presos políticos, familiares de mortos e desaparecidos
políticos que se disponham a prestar esclarecimentos e depoimentos perante a
CNV; bem como assegurar mecanismos para garantir sua segurança física, se ameaçados.
8.1. Que o recebimento de testemunhos pela CNV seja público, mas com o
devido cuidado e proteção dos declarantes, para evitar novos traumas;
8.2.
Que a oitiva das declarações se
preocupe não apenas com a narrativa dos fatos, mas também com o contexto
sociológico e o aspecto terapêutico;
8.3.
Presença de representante da CEMDP
na oitiva de testemunhos como repositório da memória histórica, bem como de
apoio psicológico;
8.4.
Que seja instituídos sistemas de
apoio e cuidados específicos em relação às testemunhas que passaram por tortura
(necessidade de suporte de acompanhamento psicossocial para evitar a
retraumatização);
8.5.
Ouvir os sobreviventes, que
constituem “memória viva” desse período;
8.6.
Que além dos assessores da CNV, a
Comissão incorpore aos seus trabalhos integrantes da CEMDP, os quais possuem
grande conhecimento sobre os fatos, acumulados ao longo de mais de 30 anos de
trabalho na área;
8.7.
Que a responsabilidade pelas
despesas financeiras, ensejadas pela oitiva de quaisquer pessoas, testemunhas,
vítimas e outras pessoas de interesse para o trabalho da Comissão, seja
atribuída à Comissão Nacional da Verdade. Nos parece claro que em um país de
proporções continentais, a distância e a falta de recursos pode ser um fator
impeditivo à colheita de depoimentos, prejudicando o alcance das finalidades da
Comissão;
9.
Promover audiências públicas dirigidas para
assuntos específicos, como os casos de mortos e desaparecidos políticos;
tortura; violações dos direitos dos povos indígenas, camponeses e comunidades
tradicionais.
9.1.
Realizar audiências em todos os
Estados da Federação;
9.2.
Realizar audiências públicas com os
Comitês/Coletivos/Fóruns da Sociedade Civil – c de todos os estados – voltados para a defesa da Memória, Verdade e Justiça
brasileira, semestralmente/quadrimestralmente, durante o período de
funcionamento da Comissão Nacional da Verdade, a fim de possibilizar o
acompanhamento parcial dos resultados do andamento dos trabalhos desenvolvidos,
bem como para se apresentar relatórios parciais da CNV à sociedade civil;
10. Dar transparência e publicidade dos atos e
atividades da CNV.
10.1. Desde o início das atividades da CNV, que seja dada publicidade a:
a) Sua regulamentação interna;
b) O montante financeiro destinado para enfrentar o
longo período de análise das violações de Direitos Humanos, definido para os
trabalhos da Comissão, como bem apregoa a Lei de Acesso à Informações.
Ressaltando que a dependência econômica certamente é uma das formas mais claras
de permitir a limitação aos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, podendo
mesmo a vir a ser estabelecida a subserviência do órgão investigador;
c) Plano de trabalho da Comissão e agenda dos membros
da CNV, incluindo também atividades semanais/mensais. Isso facilita o
acompanhamento das atividades, bem como a participação das pessoas, movimentos
sociais e entidades;
d) Informações sobre sua composição, dados, perfil,
currículo e atribuições de cada componente e inclusive assessores;
e) Informações divulgadas com antecedência sobre as
audiências públicas a serem realizadas;
10.2.
Que seja colocado um
link de acesso à página oficial da CNV em todos os sites oficiais do Estado
brasileiro.
10.3. Que exista uma equipe própria da área de
comunicação tanto para fazer o contato com a mídia como para facilitar o
contato com a população e fazer a divulgação de suas atividades.
10.4. Na página da CNV, garantir link para acesso online
das sessões da Comissão que forem públicas e de todas as audiências públicas e
oitivas de declarações.
10.5. Garantir o armazenamento de informações no site, de
modo que as sessões da CNV e as audiências públicas, além de vistas em tempo
real, possam ser vistas posteriormente via site; franquear, na página da CNV,
acesso a outras páginas já existentes e que contam com acervo de documentos;
10.6. Assegurar
espaço de divulgação das atividades na mídia oficial, por exemplo: Voz do
Brasil, TV Justiça, TV Senado, TV Câmara, TVs de Assembleias Legislativas, TV
Cultura, TVs Educativas e outras mídias oficiais, tais como os rádios e jornais
impressos e os diários oficiais.
11. Estabelecer relações adequadas e positivas
com as organizações da Sociedade Civil, visando atingir os objetivos definidos
pela Lei 12.528/2011
11.1.
Ouvir os
Comitês, Fóruns, Coletivos e demais organizações da sociedade civil que se
dedicam à busca dos direitos da Justiça de Transição, especialmente da Memória,
da Verdade e da Justiça, a partir de reuniões promovidas pela CNV;
11.2.
Estabelecer parâmetros para atuação conjunta com
essas e outras entidades da sociedade civil; seja em pesquisas, seja em
promoção de audiências públicas, etc.;
11.3.
Abrir canais institucionais adequados da CNV
para se relacionar com as organizações da sociedade civil, especialmente os
Comitês/Fóruns/Coletivos/Comissões que lutam pelo Direito á Memória, à Verdade
e à Justiça;
11.4.
Atender
às demandas de cidadãs e cidadãos que queiram aportar suas denúncias,
documentos e depoimentos, nos termos do Parágrafo 6º do art. 4º da Lei nº
12.528/2011.
11.5.
Garantir instrumentos de contato permanente com
entidades da Sociedade Civil organizadas em torno do tema da Justiça de
Transição em todo o país;
11.6.
Estabelecer parcerias com entidades
representativas da Sociedade Civil que lutam por Memória, Verdade e Justiça;
também com as Comissões Parlamentares, Comissões Estaduais e Municipais e ainda
comissões de entidades públicas, como Universidades, seja sob a forma de
convênios, Termos de Parceria ou de Cooperação, etc. – incluindo-se a possibilidade
de subsídios financeiros a entidades, quando aplicável.
11.7.
Firmar convênios e parcerias com
organizações de juventude, sobretudo, na área de comunicação e informática, com
o objetivo de aproveitar o conhecimento e a criatividade dessas entidades;
11.8.
Tendo em vista a necessidade da
reparação coletiva aos danos causados à cultura imaterial do País, seja
recomendado formalmente, ao Estado Brasileiro, a organização, em conjunto com
entidades da sociedade civil, de calendário de atividades e datas emblemáticas
(ex: 50 anos das Ligas camponesas; dia 31 de março ou 1º de abril ou 13 de dezembro, como Dia Nacional da Memória de Violação de Direitos Humanos e diversas
outras);
11.9.
A articulação com as entidades
estaduais constitui forma de assegurar uma atuação descentralizada da CNV e,
assim, mais eficaz, tendo em vista as dimensões continentais do nosso país.
12.
Contratar ou firmar convênios com instituições
e equipes técnicas de antropólogos, arqueólogos forenses, peritos e
criminalistas, bem como profissionais de História e de Arquivologia, como apoio
técnico aos trabalhos da CNV.
13.
Sobre o RELATÓRIO FINAL da Comissão
Nacional da Verdade apresentamos considerações no sentido de que seja amplo,
profundo e consistente. Que o Relatório Final:
13.1.
Faça a contextualização histórica dos graves
violações de direitos humanos, a começar com os antecedentes do golpe militar
de 1º de abril de 1964, que quebrou a ordem constitucional e depôs o presidente
eleito democraticamente pelo voto popular;
13.2.
Caracterize o regime vigente de 1964-1985 como
uma ditadura militar que se manteve no poder político pelo poder das armas e
sem legitimação do voto popular e o período de 1969-76 como Terrorismo de
Estado;
13.3.
Caracterize o regime vigente de 1985 a 1988 como
de transição civil, até a promulgação da Constituição Federal de 1988 que
reinstituiu o Estado de Direito Democrático;
13.4.
Contribua com argumentos capazes de atacar as
ideias de justiça dominantes atualmente presentes nos julgamentos dos crimes da
Ditadura Civil-Militar. O atual conceito de justiça que ampara a ideia de
julgamento, como ato de distribuição de justiça, está constituído sobre sólidas
bases, como a prescrição das violações de Direitos Humanos e a validade da Lei
de Anistia;
13.5.
Sintetize todas as agressões aos direitos civis,
como cassação de mandatos, fechamento e coerção do Congresso Nacional;
perseguição a lideranças sindicais, estudantis e suas entidades representativas
e toda sorte de danos aos direitos civis, políticos, sociais, culturais e
econômicos do povo brasileiro, com destaque aos graves atentados aos direitos
humanos.
13.6.
Seja remetido formalmente ao Ministério Público
e aos Poderes da República: Executivo, Legislativo e
Judiciário;
13.7.
Seja divulgado em livro e pelas mais
variadas formas de mídias, inclusive da rede mundial de computadores;
13.8.
Seja dada ao Relatório Final AMPLA
divulgação, para que este não seja um arquivo morto, mas sim um Relatório Vivo,
constituindo uma plataforma para que a sociedade possa tomar as medidas no
sentido, inclusive, da responsabilização daqueles que cometeram os crimes de
lesa-humanidade.
14. OUTRAS SUGESTÕES TRANSVERSAIS IMPORTANTES
14.1 Que seja objeto de apuração e
investigação a conduta do Poder Judiciário, sua omissão ou conivência com
violações dos direitos fundamentais sistematicamente praticadas pela Ditadura
Militar. (os relatos de tortura, por exemplo, devem apontar autoridades do
Judiciário que tomaram conhecimento dessas violações e as ignoraram; ou que
ignoraram evidências flagrantes de assassinatos, e/ou aceitando versões
forjadas de suicídio, ou "morte em fuga" etc.);
14.2 Que em suas atividades de pesquisa e
investigação, a CNV siga eixos temáticos, dentre os quais: mortos e
desaparecidos; torturas e prisões; financiamento privado à ditadura; estrutura
da repressão e formas de monitoramento; diferentes métodos de repressão; locais
e centros de repressão; terrorismo de Estado (bombas, atentados...); colaboração
internacional e Cone Sul (Operação Condor); imprensa e colaboração; arquivos;
repressão no setor público; repressão aos operários na iniciativa privada; sistema
de justiça: participação de juízes e promotores; outros profissionais
colaboradores (médicos, por exemplo); repressão no meio militar; repressão no
campo; ditadura e comunidades indígenas; corrupção no ambiente político e desvios
de recursos públicos;
14.3 Que durante todo o período de
funcionamento da CNV, sejam garantidos os canais de comunicação e mecanismos de
participação da sociedade, nos trabalhos de produção de informação e análises a
serem empreendidas. Para tanto, demanda-se a transparência e publicidade de
todas as atividades planejadas e realizadas da CNV, com a devida abertura para
o controle social e monitoramento por parte da sociedade civil. Igualmente,
demandam-se mecanismos participativos de consultas e audiências públicas, para
a efetiva condução democrática deste processo político.
14.4 Que as atividades e resultados da CNV
sejam sistematizados em relatórios parciais periódicos a serem amplamente
divulgados e publicizados; e que o relatório final da CNV seja extremamente
detalhado, contendo não apenas informações de esferas individuais de vítimas,
mas também o contexto social, político, econômico e cultural do projeto de
sociedade que se implantou com a ditadura, assim como a relação nominal dos
responsáveis, autores, executores e mandantes das violações atribuídas ao
regime ditatorial.
Considerações finais
Estamos convencidos que a
verdade sobre este período histórico interessa não apenas os atingidos, seus
familiares e amigos, mas diz respeito a toda a sociedade brasileira.
O desconhecimento dos fatos é
para toda a sociedade civil extremamente danoso e impeditivo de uma trajetória
democrática plena, segundo a Constituição Federal de 1988.
Entendemos a CNV como etapa
importante para conformar o processo histórico e efetivação da Justiça de Transição. Estamos convictos de que a iniciativa
de sua criação não supre o dever do Estado brasileiro de levar adiante os
julgamentos e a responsabilização criminal dos agentes, públicos e privados,
por suas ações, cumplicidades ou omissões.
Avaliamos como
necessário que a CNV, sem prejuízo de investigações próprias, se valha
dos acervos e experiências da Comissão da Anistia e da Comissão Especial sobre
Mortos e Desaparecidos Políticos como recomenda a Lei nº 12.528/2011 e também
das recomendações do III PNDH (Decreto nº 7.037/2009) e dos acervos e
experiências de entidades da sociedade civil, de ex-perseguidos e presos
políticos e dos familiares de mortos e desaparecidos políticos.
Para que não se esqueça. Para que nunca mais
aconteça!
Lembrar para não repetir!
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