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segunda-feira, 26 de agosto de 2013
COLETIVO ANARQUISTA BANDEIRA NEGRA APOIANDO SEMANA PAULO STUART WRIGHT
"O Coletivo Anarquista Bandeira Negra, integrante da Coordenação Anarquista Brasileira, no contexto da “Semana Paulo Stuart Wright – 40 anos de seu desaparecimento”, a acontecer entre os dias 03 a 05 de setembro de 2013, na Assembleia Legislativa de Santa Catarina, torna pública a sua contribuição na luta pela verdade dos crimes de Estado e dos civis envolvidos na ditadura civil-militar (1964-85)."
Nota: As permanências da ditadura civil-militar em Santa Catarina
A História é uma interpretação do passado com os olhos de hoje, o que faz necessário tratar a ditadura civil-militar com os olhos das lutas populares, classistas e combativas. No cotidiano das lutas populares de Santa Catarina são perceptíveis as permanências da ditadura civil-militar; o abuso de poder da Polícia Militar, as ameaças à classe trabalhadora sindicalizada e os mandos governamentais para atender os luxos dos/as empresários/as. Para além disso, das ações pontuais da corporação militar, a sombra da ditadura permeia todo um imaginário de controle e vigilância permanente sob a forma da criminalização do protesto e dos movimentos sociais, ancorados nas mesmas oligarquias políticas locais.
O Coletivo Anarquista Bandeira Negra, integrante da Coordenação Anarquista Brasileira, no contexto da “Semana Paulo Stuart Wright – 40 anos de seu desaparecimento”, a acontecer entre os dias 03 a 05 de setembro de 2013, na Assembleia Legislativa de Santa Catarina, torna pública a sua contribuição na luta pela verdade dos crimes de Estado e dos civis envolvidos na ditadura civil-militar (1964-85).
Consideramos necessário pontuar as seguintes questões ao debate:
1) Em 124 anos de Brasil República, está evidente a cultura política autoritária das elites brasileiras. No período republicano, sofremos com 36 anos de regime ditatorial. Quando lembramos a Ditadura no Brasil, esquecemo-nos de afirmar que o período de Getúlio Vargas (1930-45) também compôs com o Estado Novo. No episódio, muitos companheiros e companheiras foram para os cárceres, torturados/as e morreram ao lutarem por justiça social, liberdade e igualdade. Junto ao golpe civil-militar de 1964, reafirmou-se a cultura política autoritária inaugurada com o projeto explorador português.
2) A ditadura civil-militar não foi um fato isolado nas fronteiras brasileiras. A sua articulação e realização foi uma ação pensada em esfera global, dentro do contexto da Guerra Fria. Diversos lutadores/as populares organizados/as sofreram, inclusive com a entrega de suas vidas nas mãos das ditaduras na América Latina. Lembramos de nossos/as companheiros/as presos/as, torturados/as e mortos/as em praticamente todos os países da sofrida e lutadora América Latina.
3) O golpe de 1964 foi um projeto civil, representando os interesses conservadores das elites da burguesia nacional, agrária e industrial, ancorada no projeto de intervenção imperialista dos Estados Unidos contra uma projeção em escala do comunismo no continente americano; a Igreja, a política partidária e as mídias corporativas tiveram um papel preponderante, em diferentes estados brasileiros, na composição desse golpe. É importante considerar a articulação empresarial e midiática na construção social do golpe, que pôde criar, a partir de seus interesses privados, tempos difíceis para a organização e resistência do povo brasileiro. Na busca por exemplos, lembramos que na cidade de Joinville/SC, entre os anos de 1962-63, a elite empresarial organizou cursos de formação sobre o “perigo do comunismo” e a importância do apoio da população às manobras militares na “defesa do Brasil” contra os perigos das forças subversivas internacionais. O curso atingiu principalmente os/as trabalhadores/as das fábricas e dos comércios, assim como estudantes do ensino médio e técnico. O jornal A notícia, na época de propriedade do prefeito Helmuth Fallgater (1961-66), noticiava os perigos das supostas forças subversivas internacionais. Depois do golpe em 1964, passou a defender a ditadura civil-militar. Os cursos bancados pela elite local e a mídia construíram consciências forjadas no medo, provocando o silêncio frente aos problemas enfrentados pela classe explorada. A resistência popular não pôde silenciar as forças repressivas e mantenedoras destas formas de consciências. As ações de resistência aconteceram com expressividade e combatividade em alguns pontos, mas não se generalizaram como previam os grupos armados. É fato que a Operação Barriga Verde, em 1975, reprimiu fortemente a militância local. A repressão do Comando de Caça aos Comunistas também caiu sobre o povo organizado junto às Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) na zona sul de Joinville/SC. A resistência também teve como palco cidades como Florianópolis, Itajaí, Criciúma e outras, quando os/as estudantes das escolas públicas secundaristas sofreram com perseguições, grêmios estudantis fechados e membros de diferentes organizações políticas foram presos/as, inclusive desaparecidos/as até hoje.
4) Em 21 anos de ditadura civil-militar, em Santa Catarina, as forças repressivas do Estado e de setores da sociedade articularam e realizaram perseguições, ameaças, prisões, torturas, desaparecimentos e mortes de centenas de homens e mulheres de diferentes idades de Santa Catarina. No meio do povo oprimido e explorado, criar o palco e a necessidade da resistência era pertinente.
5) No processo da reabertura da democracia parlamentar, da Anistia, em 1979, à realização da Constituição Brasileira, em 1988, a elite política e econômica catarinense, defensora e articuladora do golpe, principalmente sob governos e senadores influentes até hoje como Espiridião Amin e Jorge Bornhausen, adaptou-se aos novos tempos. Deixaram os discursos repressivos para disparar palavras de ordem favoráveis à cidadania. No entanto, o conservadorismo político em andamento se coloca como antagônico aos interesses das classes trabalhadoras rurais e urbanas organizadas. Pensar o golpe de 64 e outras intervenções no continente não significa que manifestações autoritárias sejam fenômenos isolados de um contexto histórico e político. Amplos setores populares, vítimas dos anos de chumbo, continuam combatendo o Estado e o capitalismo, em todas as suas formas.
6) Não devemos nos esquecer que o Estado brasileiro permanece imóvel em relação à abertura total dos arquivos da ditadura, enquanto em outros países vizinhos a pressão popular fez com que se avançasse nesse sentido, inclusive condenando ex-agentes e torturadores do Exército. Ou seja, a omissão e a impunidade continuam sendo uma afronta à liberdade de expressão, enquanto não houver a condenação dos responsáveis pelos crimes de Estado. Junto aos CDHs [Centros de Direitos Humanos] e demais setores mobilizados pela luta de ex-presos/as políticos e desaparecidos/as, a necessidade de reconhecer a construção pública da verdade só tende a ampliar a resistência permanente a esse modelo.
7) Nas jornadas de lutas de Junho e Julho de 2013, ficou evidente o quanto restou da ditadura civil-militar nas instituições de poder. Como elemento presente, os setores mais conservadores e reacionários, na tentativa de rearticulação nacional, mobilizaram recursos na criação de novos partidos e movimentos de extrema direita, como o Partido Militar Brasileiro [PMB] e a Arena.
Atuando nos setores mais combativos e em luta na realidade brasileira, o CABN reafirma a posição publicada no informativo Socialismo Libertário (07/12), que defende a “abertura efetiva dos arquivos da ditadura e condenação dos torturadores e mandatários dos crimes de Estado nesse período.” Hoje, é preciso promover o debate para além das audiências públicas de caráter institucional, promovidas, em geral, nos espaços da democracia representativa burguesa. O debate precisa ocupar as ruas, junto aos movimentos sociais, nas ocupações urbanas e rurais e demais expressões da luta popular. Enquanto houver criminalização da pobreza e dos movimentos sociais, as facetas da dominação e exploração ainda não deixarão as possibilidades de libertação social acontecerem. Devemos ajudar a construir as memórias históricas e não apagá-las, intervindo na educação de base, nas cidades e no campo.
Sempre com os de baixo e à esquerda na luta por um olhar popular e classista da História. Vamos ombro a ombro com os nossos irmãos e nossas irmãs de classe por uma cultura política classista, combativa e revolucionária.
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