Páginas

segunda-feira, 1 de maio de 2017

VIOLETA

Sempre fui um apaixonado pela obra e pela vida trágica da autora e cantora chilena Violeta Parra. Nunca compreendi como é que uma mulher que, juntamente com “La Canción de los Hermanos” de Atahualpa Yupanki, compôs uma das músicas mais lindas que a humanidade já conheceu (Gracias a La Vida)  suicidou-se logo a seguir.

Na verdade, ela morreu por amor, apaixonada por um músico europeu, deixando evidente que nem as grandes revolucionárias, como ela, estão imunes à tragédia das paixões humanas.

Traduzi  trechos de uma poesia, uma das páginas mais lindas da literatura universal que um irmão possa ter escrito para uma irmã. Trata-se de Defesa de Violeta, do poeta Nicanor Parra, seu irmão, que em setembro estará completando cem anos de idade.

Doce vizinha da verde selva,
Hóspede eterna de um abril florido
Grande inimiga da mediocridade:
VIOLETA PARRA!
Jardineira, artesã e costureira.
Bailarina da água transparente,
Árvore cheia de pássaros cantores,
VIOLETA PARRA!
Percorrestes todos os caminhos
Desenterrando vasos encantados
E libertando pássaros cativos entre os galhos.
Preocupada sempre com os outros,
Quando vais ocupar-te de ti mesma?
VIOLA PIEDOSA...
Tua dor é um círculo infinito
Que não começa nem termina nunca
Mas tu te sobrepões a tudo
VIOLA DIVINA!
Andorinha, gaivota de água doce,
Todos os adjetivos são bem poucos,
Todos os substantivos são bem poucos
Para chamar-te.
Mas os burocratas não te querem.
Fecham as portas de tua casa
E te declaram uma guerra mortal,
VIOLA DOLOROSA!
Porque tu não te compras nem te vendes
Porque não te vestes de palhaça,
Porque falas a língua da terra,
VIOLA DO CHILE!
Como vão te querer? Eu me pergunto...
Porque são esses tristes funcionários
Cinzentos como as pedras do deserto...
Não acreditas?
Por outro lado tu, Violeta dos Andes,
Flor da Cordilheira e da costa,
És um manancial inesgotável de vida humana.
Teu coração se abre quando quer,
Tua vontade se fortalece quando quer
E tua saúde navega quando quer, rio acima.
Basta que tu as chames por seus nomes
Para que as cores e as formas se levantem e andem como Lázaro
... em corpo e alma.
Ninguém pode se queixar quando tu cantas baixinho
Ou quando gritas
Como se estivessem te degolando:
VIOLA VULCÂNICA!
Raios são os que saem de tua voz
Para os quatro pontos cardeais,
Colhedora de uvas de olhos negros,
VIOLETA PARRA!
Todos devem guardar um profundo silêncio religioso
Porque teu canto sabe aonde vai,
Perfeitamente!
Isto é o que eu queria te dizer!
Continúa tecendo teus arames,
Teus ponchos de índio araucano,
Tuas tigelas do fim do mundo,
Tuas estátuas de madeira sagrada.
Sem aflição, sem lágrimas inúteis
Ou, se quiseres, com lágrimas ardentes
E recorda que és
Um cordeirinho disfarçado de lobo...                            


Nenhum comentário:

Postar um comentário